Não
se deve confundir a economia de mercado das formações sociais anteriores ao
capitalismo com economia de mercado capitalista. Nas sociedades anteriores à
nossa, os indivíduos dependiam apenas parcialmente do mercado e, no essencial,
a riqueza era representada pela terra. Já na sociedade capitalista, os
indivíduos dependem principalmente do mercado e, no essencial, a riqueza é
representada pelo dinheiro.
Assim,
no momento em que os indivíduos passaram a depender fundamentalmente do mercado
é que se consolida o sistema econômico capitalista. Mas a mudança não ocorreu
de repente, da noite para o dia. Foi preciso que uma série de fatores
desencadeassem um processo de políticas favoráveis ao pleno desenvolvimento do
capitalismo.
O processo de desenvolvimento
econômico que fez da Europa líder comercial do mundo desde a modernidade até
meados do século XX, em geral, é atribuído à interação de variáveis políticas e
sociais e de elementos materiais representados pelas características do relevo,
do clima e da vegetação.
Nas condições de poder
descentralizado do feudalismo, alguns nobres toleraram e até incentivaram as
atividades em seus domínios de mercadores, banqueiros, negociantes de armas e
artesãos, indivíduos autônomos e importantes na estrutura social. Somaram-se a
essa circunstancia uma paisagem diversificada e uma variedade climática
responsáveis pela existência de diferentes tipos de produtos apropriados à
troca.
Aos poucos e de maneira desigual,
iniciou-se, principalmente na Europa ocidental, uma centralização da autoridade
política, fundamental ao desenvolvimento econômico. Nesse sentido, diversos
Estados nacionais optaram por diferentes práticas mercantilistas, responsáveis
por uma expansão sem precedentes e por uma competição predatória. Nessa selva
econômica, saíram vencedores aqueles países que demonstraram capacidade de
adaptação e competitividade,
Algumas práticas que emergiram desse
universo econômico tiveram como diretrizes o metalismo, a balança comercial
credora, o cameralismo e o colonialismo.
Os Metalistas ou bulíonístas
preconizavam que a riqueza estava relacionada com a capacidade de se conseguir
acumular o máximo de ouro e prata. Essa prática, adotada especialmente pelos
espanhóis entre os séculos XVI e XVII graças à descoberta de metais preciosos
em suas colônias na América, contou com as seguintes regras:
1ª) evitar ao máximo as importações,
a fim de impedir a saída de metais preciosos do país;
2ª) "balança de
contratos", termo que designava a imposição de restrições ou
protecionismos em contratos comerciais assinados entre nações.
Estima-se que 18 mil toneladas de
prata e duzentas toneladas de ouro foram levadas da América para a Espanha
entre os séculos XVI e XVI I.
Além da extração de metais preciosos
da América, outras atividades se constituíram em valiosas fontes de riquezas
para a Espanha, como a produção de açúcar, rum e melaço, o comércio de escravos
negros e a pilhagem. Mas os reis dissiparam boa parte desses recursos,
utilizando-os para pagar empréstimos estrangeiros, financiar guerras ou para
comprar dos mercadores italianos, franceses, holandeses e ingleses produtos que
não eram produzidos pela nação espanhola.
A idéia de uma balança comercía1
credora teve como resultado duas práticas que fica, ai n conhecidas como
industrialismo e comercialísmo. 0 objetivo era promover um superávit da balança
comercial, isto é, exportar mais do que importar. Isso permitiria o ingresso de
riquezas, expresso em entrada de moeda metálica, no Estado nacional.
O industrialismo também se tornou
conhecido como coffiertísmo devido ao impulso que essa política recebeu de
Colbrt, ministro de Luís XIV. Na França do século XVII foi incentivada a
indústria manufatureira, que tinha produção mais regular e mais previsível do
que outros setores da economia, como a agricultura por exemplo, e gerava bens
exportáveis de maior valor específico. Tecidos de luxo, malharia, tapeçaria,
porcelana, objetos de vidro, armas e papéis passaram a fazer parte da pauta de
exportações dos franceses.
Tal política refletiu o pensamento
dos mercantilistas franceses, que recomendaram o estímulo ao comércio nacional
para impedir que mercadores estrangeiros retirassem ouro e prata do reino. Além
disso, preconizaram a conquista colonial, fonte inesgotável de riqueza.
Já os ingleses optaram pelo
comercialísmo através de estímulos à produção manufatureira, especialmente de
têxteis. Também foram incentivados o desenvolvimento da marinha mercante e as
atividades dos piratas, que pilhavam os galeões espanhóis carregados de metais
preciosos.
A política mercantilista inglesa dos
séculos XVI e XVII coincidiu com a expansão marítima e colonial. A Companhia
das índias Orientais, organizada em 1600, deu à sua criadora, a rainha
Elizabeth, entrepostos na índia, na Indonésia e no Japão. Posteriormente os
ingleses se instalaram na Pérsia (atual Irã), Bombaim (Índia) e na América,
tanto nas Antilhas quanto no continente, onde fundaram as 13 Colônias.
O resultado desta política
expansionista se fez sentir no desenvolvimento do comércio exterior e na
marinha mercante britânica. Minérios como alúmen, o papel e principalmente os
têxteis passaram a ser exportados com regularidade pelos ingleses.
Dois "Atos de Navegação"
tiveram enorme importância para o desenvolvimento da marinha mercante britânica
no período mercantilista. O primeiro, promulgado em 1651 por Cromwell,
estabelecia que as mercadorias européias só poderiam ser transportadas em
navios ingleses ou em navios de seu país de origem; os produtos da África, da
Ásia e da América só poderiam ser importados em navios da Inglaterra ou das
colônias. O segundo ato, promulgado em 1660, especificava que o capitão e pelo
menos três quartos da tripulação dos navios deveriam ser ingleses.
Tais medidas mostraram-se cruciais
para o enriquecimento do Estado inglês, a expansão colonial do país e a vitória
britânica sobre seus mais fortes concorrentes: a Espanha (no fim do século
XVI), a Holanda (no século XVII) e posteriormente a França (no século XVIII).
Fragmentados em centenas de unidades
com diferentes tamanhos e graus de soberania, os Estados germânicos adotaram
uma política econômica mercantilista diferente daquelas do restante das nações
européias, conhecida como cameralismo. Essa expressão que se originou de
Kammerou tesouro real, designava medidas que pretendiam combater os efeitos da
divisão territorial excessiva e também a destruição provocada pela Guerra dos
Trinta Anos (1618-1648).
A política econômica adotada pelos cameralistas
teve como diretriz o aumento da riqueza tributável, isto é, o aumento dos
impostos, e como conseqüência o crescimento da renda dos Estados. Por meio de
regulamentações, os príncipes das unidades políticas mais significativas,
sobretudo a Áustria, organizaram e controlaram a produção agrícola e
manufatureira. As exportações de matérias-primas e as importações de produtos
manufaturados foram proibidas.
Essas práticas sobreviveram nos
Estados germânicos durante aproximadamente três séculos. Contribuíram para que
os mesmos se aproximassem da auto-suficiência econômica no século XIX, quando
foram unificadas em uma só entidade política, a Alemanha imperial.
Na Holanda, uma alva burguesia
mercantil e bancária desenvolveu uma política mercantilista apoiada em três
sólidos pilares: a Companhia das índias Orientais, encarregada de dirigir o
comércio holandês no Oriente (compras, remessas de ouro, venda das mercadorias
recebidas); o Banco de Amsterdã, responsável pelo fornecimento de crédito e de
moedas de todos os países aos mercadores, para que pudessem comprar mercadorias
de qualquer origem; e uma frota mercante capaz de transportar cargas pesadas e
volumosas ao longo das rotas marítimas.
Os holandeses desenvolveram ainda
várias atividades de transformação, tais como a indústria de lanifícios e
tecidos; tingimento e tecelagem da seda; acabamento de tecidos ingleses; corte
de diamantes; cervejaria; destilaria; preparação de sal, tabaco e cacau;
trabalho de chumbo; polimento de lentes ópticas; fabricação de microscópios,
pêndulos e instrumentos de navegação; impressão de mapas (terrestres e
marítimos) e de livros em todas as línguas.
A política colonialista, por sua
vez, teve corro preocupação a incorporação de extensas regiões da África, do
Oriente e da América à economia européia. Baseou-se no chamado pacto colonial.
Pelo pacto ou exclusivismo colonial,
a colônia existiria em função da metrópole, e apenas para ela. Isso significa
que a produção colonial deveria possibilitar lucros elevados aos comerciantes
metropolitanos, que monopolizavam as importações e as exportações. A atividade
econômica das colônias deveria apenas complementar as respectivas metrópoles,
sem jamais concorrer com elas. Essa política restritiva foi adotada por
Portugal e outros Estados europeus detentores de impérios coloniais.
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